O Preço das Escolhas

Diz a lenda que Éris (veja mais aqui), filha de Hera e Zeus, irmã de Ades, obrigou Páris a presentear uma entre três deusas do Olimpo com uma maçã de ouro. Páris, seguindo o coração, escolhe Afrodite, deixando Hera e Atena de lado, provocando a fúria das outras duas deusas, embora garantindo a proteção da deusa escolhida.

Que exemplo melhor que esse para falar sobre escolhas? Uma escolha sempre pressupõe admitirmos nossa preferência (e podermos ser muito felizes por ter feito isso), mas também pressupõe escolhermos a ira das outras deusas, não escolhidas. Roberto Bly afirma que “quando uma pessoa escolhe o que lhe é mais precioso, esse ato é sério. A escolha termina bem, mas não para as divindades rejeitadas.” (BLY, Robert (1991). João de Ferro – um livro sobre homens. Rio de Janeiro, Elsevier: 166)

Já é lugar comum dizer que a vida é feita de escolhas. Contudo, ao conversar com amigos e perceber o comportamento geral da sociedade atual, parece-me que a tendência é ficar em cima do muro e não escolher. Ou, então, deixar que a vida faça a escolha por nós. É como se quiséssemos, a todo custo, evitar a fúria das deusas rejeitadas, mesmo que, para tanto, também deixemos de viver como heróis da deusa escolhida. O preço que pagamos por viver “em cima do muro” é uma falsa sensação de harmonia, o adiar constante de sorrisos e momentos felizes. Evitamos o conflito da escolha, mas evitamos também uma vida de sucesso, de alegrias. Apesar do confronto que virá se escolhermos só uma das deusas, precisamos disso. “A criança não se tornará adulto enquanto não superar o desejo de harmonia, escolher a coisa preciosa e entrar numa jovial participação nas tensões do mundo.” (Roberto Bly, 1991:167)

Outra “tendência” que percebo nas “escolhas” (ou pseudo-escolhas) da atualidade é a história de preferir o certo ao duvidoso, mesmo que o duvidoso nos seja mais precioso. A questão aqui é bem mais complicada que o simples “em cima do muro”. Eu não consideraria uma “escolha” o fato de seguir o que a vida escolheu para mim. É então que chego a mim. Escolher a deusa que sabemos não ser a certa é trazer, inclusive, a fúria daquela que nos é mais preciosa. Recentemente, quase escolhi a deusa errada por causa das promessas que esta me fazia, nenhuma verdadeiramente tocante em meu coração. Já escolhi outras vezes a deusa menos preciosa por conta de suas promessas. Não é bom. É difícil viver sob a proteção daquele que você desgosta e prefere distância.

Ainda citando Robert Bly: “Se escolhermos ‘a coisa preciosa’ – o objeto do nosso desejo – então, segundo os alquimistas, o Rei interior em nós, que estava adormecido há tantos anos, acorda.” (1991:167). E só podemos ser verdadeiramente humanos quando deixamos nosso Rei – ou Rainha – interior acordar. Mas queremos isso? Queremos nos tornar adultos? Queremos que nossos Reis e Rainhas acordem e nos guiem, vibrantes, através das tensões do mundo? Ou preferimos viver uma calmaria ilusória, ficando em cima do muro e argumentando repetidas vezes, como se quiséssemos nos convencer, que “está bom assim”?

Eu fiz minha escolha. Já sinto a fúria das outras deusas. Mas sinto também a proteção e consideração da minha preferida e sinto o Rei interior acordar dentro de mim. E embora tudo seja ainda muito novo, só sei que é bom, é muito bom!

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Uma resposta para O Preço das Escolhas

  1. Caio disse:

    AMEI! Eu acabei não escolhendo a deusa mais aventureira no sentido pessoal e agora tô sentindo a sua punição. Está foda, mas a deusa da conformidade fica sussurrando no meu ouvido um mantra que é mais ou menos um “espere e verás” com “tenha calma” e “em breve tudo se acerta”… Já no profissional acabei sendo escolhido, destino, acaso, karma, não sei, mas parece que vai ser bom…
    De qualquer forma, eu não escolhi o mesmo caminho que você e você não sabe como tenho orgulho em conhecer alguém que escolhe essa tal entidade da mudança. Vai dar tudo certo, espero que você sinta tanto orgulho de você como eu e todas as pessoas que conhecemos em comum!
    Muita sorte pra você!
    Beijos
    K

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